Sublimação da matéria

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Publicado em

Prémio Literário António Cabral 2017

pouso a mão sobre a terra e digo: sou
daqui, esta é a minha casa, aqui pertenço.
eu sou deste país feito de barro e pedras
onde à noite vêm beber as árvores, onde
nascem os rios e acordam as palavras.

afago com a mão a terra e não resisto
a declarar: amo-te com tua rudeza, tua
brutalidade, teus vermes e teus frutos
futuros, tuas correntes magníficas
subterrâneas de um ciclo perpétuo e
sem tumulto. estendo a mão e adivinho
a calma acesa, o coração aberto, o
fogo incendiando o estrume: tudo em ti
permanece e de ti se alimenta, tudo
converge para ti e lá perdura. estão

em ti, disseminados em partículas
minúsculas, cada dia se afastando mais,
todos quantos amei e amo estando em ti
sob a campânula verde das palavras.
partem de ti os fluxos e os refluxos, o
mar sucumbe na maré dos teus lábios
onde a saliva se transforma em espuma.
pouso a mão e respiro a seiva úbere
da terra, território de lume paus e pedras,
esse país com tanto amor feito de barro.

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