Sol crescente

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Neste Julho de sol crescente em que até as pedras se convertem em frigideiras gosto de ir até ao quintal e sentar-me à entrada do alpendre, sob a ramada. – Olhe que as plantas, desde uma ervinha a uma videira, têm a sua parte d’alma; ora veja se consegue notar; às vezes, só de estarmos ao pé delas, começam a mexer-se como se lhes desse um ventinho – disse-me já o ti Quim. Por que será que a corriola, ou tangibrança, como aqui mais se diz, sobe aos abraços por aquela cepa?

Pus-me a fitar a ramada. Concentrei-me. Primeiro fechei os olhos. Depois abri-os e assim fiquei por longo tempo, como se decorressem três, trinta, trezentos anos; as folhas buliam, ouvia-lhes um murmúrio. Até que senti que algo se enchia de tempo, começando já a transbordar. Levantei-me da cadeira de lona e descobri num cacho de moscatel um bago completamente maduro, já tinto, retinto. Colhi-o. Saboreei. O ti Quim tinha razão. Vou-lhe contar o sucedido. A menos que…

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